O futebol brasileiro para se "tomar" com canudo descartável

Segunda-feira, a tabela remota anunciava Água Santa x Red Bull para a noite.

Um observador desavisado logo poderia associar a descrição a uma mistura nova de bebidas para uma segunda etílica.

Outro confundir a nomenclatura com uma guerra espiritual contra o alcoolismo.

Nem lá, nem lô...

Pois é, nem só com whisky se mistura o energético que promete te dar asas.

Mas, antes de qualquer coisa, banal associação sobre os nomes, vou logo apresentar outra curiosidade entre as partes.

Ambos os times tem hinos oficiais compostos por dois “funkeiros”.

O Água Santa teve canção composta pelo “Forrest Gump” brasileiro, Naldo. Já o Red Bull é embalado pelo MC Guimê, recém excluído do BBB:

"No flow, por onde a gente passa é show... tocou Neymar é gol"

Uma pérola...

Irrelevâncias musicais a parte, voltemos ao campo das bebidas...

Água Santa X Red Bull representa apenas o retrato do novo futebol brasileiro, que começa a ser dominado pelos tais times empresas e suas marcas agregadas a insígnias tradicionais, ou não.

Tudo bem, o Água Santa, apesar de ser um clube-empresa carrega o nomede batismo de uma equipe amadora de Diadema.

O Red Bull não. Esse subverteu, desconfigurou em absoluto as marcas e cores do tradicional Bragantino, time da terra da lingüiça paulista, campeão estadual, vice brasileiro e que causou furor na década de 90.

Red Bull, aliás, talvez seja o maior símbolo da nova dinâmica da bola.

Conglomerado que espalha seu projeto por vários países. Da Áustria ao Brasil, passando pelos Eua e Alemanha.

Em solo germânico, aliás, está o carro, digo touro-chefe da franquia: RB Leipzig que em sete anos subiu cinco divisões e já beliscou um vice campeonato na Bundesliga. Baseado na tradição bávara, Segundo lugar é título na terra do quase imbatível Bayern de Munique.

Mas, voltando a nossa cachaça, digo futebol...

Para nos ater apenas a participação de bebidas nos campos, é inevitável lembrar do derrame leitoso de dinheiro da Parmalat nos anos 90, quando praticamente se apossou de clubes como Palmeiras, Juventude etc, antes, bem antes da venda efetiva de agremiações virar o desejo de 11 em cada 10 clubes brasileiros.

Ao remete a esta época a imprensa esportiva, invariavelmente, se refere como PALMEIRAS PARMALAT.

E se voltarmos mais um pouco, guardadas as devidas proporções, lembraremos que nos anos 80 a Coca-Cola praticamente monopolizou o futebol de elite brasileiro chegando a patrocinar quase 70% das equipes na finada e polêmica Copa União de 87.

“Respire Futebol. Coma Futebol. Beba Coca-Cola.”

Atualmente aqui, além dos citados, Água Santa e Red Bull, o futebol em formato líquido tem ainda o Doce Mel (polpa de frutas na Bahia), Maguary (suco de caixinha) em Pernambuco e claro, o São Paulo Crystal na Paraíba.

O time, sediado em Cruz do Espírito Santo, por sinal, chega pela segunda vez a semifinal do Campeonato Paraibano apenas com pouco mais de 5 anos de existência.

Se o líquido predomina atualmente, mesmo se tratando de “água que passarinho não bebe” no caso paraibano, o primeiro produto culinário extra-campo a financiar futebol foi sólido, bem sólido.

Quem não lembra do Perilima, tradicional saco de pancadas do futebol local, já apelidado de Íbis paraibano?

O time formado pelas iniciais de Pedro Ribeiro Lima e sustentado pelas tradicionais sordas da marca, aquelas bolachas pretas de padaria, tão tradicionais no Nordeste.

Só esperamos que o próximo estado do futebol brasileiro não seja vaporizado. Sair do líquido ao gasoso e evaporar de vez em clubes de fachada, sem história, símbolos, identificação além de CNPJ.

Que a modernização não destrua de vez os elementos peculiares, singulares do futebol brasileiro, cada vez mais gourmetizado, elitizado, menos popular e... gelado.