marcosthomazm
"TOTONHO, VENHA SALVAR O MUNDO!!"

O “cabra” Totonho é a personificação da revolução, da liberdade, quebra de paradigmas e ruptura de qualquer padrão estético ou sonoro!! Meu primeiro contato com a música do filho do solo seco do Cariri Paraibano, da tórrida Monteiro, foi através do genial disco “Sabotador de Satélites”, lançado há quase 15 anos, no já distante começo deste século. Passados mais dois álbuns, completando o que o próprio denomina como “A Trilogia do Inferno” (um disco de hip-hop, outro de funk e um de samba), pude revê-lo ao vivo no fim do ano passado em um dos shows de lançamento do “Samba Luzia Gorda”, uma homenagem materna daquelas que só o Totonho poderia gestar (a imagem da capa, que também ilustra este texto, é da mãe dele, Luzia)...
In loco, tête a tête com aquele rebanho no palco, me deparei com uma seleção de canções do ainda desconhecido para mim, “Samba Luzia Gorda”, o tal novo trabalho. Em meio a bem elaborados arranjos e letras intensas, doídas, de autênticos sambas de raiz, partido alto etc, que não deixam a dever a nenhum bamba das altas rodas cariocas ou do seminal Recôncavo baiano (onde tudo começou, pois “o Samba nasceu foi na Bahia”, não esqueçamos), o que vi foi um Totonho, que consegue subverter e surpreender até entoando com autoridade de um sambista do morro o mais tradicional dos ritmos brasileiros.

Seguindo seu ímpeto de eterno desconstrutor dos formalismos, o caririzeiro, consegue nos brindar com sambas da mais alta estirpe e ao mesmo tempo desfilar seu arsenal de iconoclastia, sem perder o passo, mesmo quando desafina com estilo e sem o menor pudor, como só ele sabe fazer... Aliás, coragem e ousadia para expor as próprias fragilidades em conceitos técnico-musicais (se é que são, de fato, fraquezas), sobram ao longo de todo o trabalho de Totonho. Assim como em sua obra completa ele também esbanja talento único para flutuar entre panfletos subversivos e letras carregadas de crítica social (“Tem mais Igreja do que Supermercado”), maneirismos regionais (“Segura a Cabra”), o bom e velho “duplo sentido” Nordestino (“Você tá doida pra me dar...”), puro humor escrachado e despretensioso (“Amassar a Lataria”) a verdadeiras poesias sensoriais (“...são frios, são glaciais, os ventos da solidão...”).
Nesta pegada sem regras, o cabra destila de uma só golada: côco, psicodelia, funk, rock e todo tipo de bagaça que ele possa jogar no liquidificador e reciclar em produto artesanal exclusivo com o selo caprino de qualidade. E não ouse resumir tudo a folclore ou deboche (não que isso seja pouca coisa, quando desenvolvida com tamanha originalidade)! O homi é uma autêntica maquina processadora de informação em alta rotação e capaz de despejar tudo isso misturado, sem opção de distinção! Acrescente ao caldeirão as rimas pouco convencionais aqui, métricas descompassadas acolá, uma verdadeira rebeldia rítmica na pronúncia silábica, ali (uma coisa “Belchiorana” de estender fonemas e anasalar alguns sons) e versos e melodias sublimes também como a singela (“Eu mandei meu amor pro Espaço”).
Agora basta embalar tudo isso com uma força carismática, humor espontâneo e força de palco contagiante e bem vindo a catarse do universo libertador de Totonho.
Em meio a um cenário de homogeneização musical, pasteurização uniforme e medíocre do que é exibido na grande mídia (quando o formato escolhido e quase único foi colher os piores ingredientes do axé, forró eletrônico, arrocha, calipso e sertanejo – ARGH- e misturar tudo em uma batedeira), Totonho está pronto para “espanar as maldades do mundo, com 'paia' de coqueirooooÔ”!!